Quando o Povo de Deus Planeja suas Ações

Então, se dispôs Eliasibe, o sumo sacerdote, com os sacerdotes, seus irmãos, e reedificaram a Porta das Ovelhas. (Ne 3:1a)

No último artigo, que teve por base Neemias 2:11-20, paramos a nossa jornada, exatamente no momento em que Neemias recruta várias pessoas para trabalharem na reconstrução dos muros de Jerusalém. Primeiro ele fez uma inspeção, tomou ciência da situação, e, depois, convocou: “Vamos reconstruir”. Várias pessoas aceitaram à convocação e uma grande mobilização tomou conta de Jerusalém e dos seus arredores. Havia muito trabalho pela frente e muitas pessoas dispostas. Como Neemias conseguiu organizar todas elas e distribuir corretamente as tarefas? É disso que trata este estudo.
A base é o capítulo 3 de Neemias. Em nossa leitura diária da Bíblia Sagrada, quando nos deparamos com um capítulo como este, que fornece uma longa lista de nomes e lugares, somos tentados a passar por cima, “pular” a página e ir para a próxima. Se você já fez isso alguma vez com o capítulo 3 de Neemias, perdeu excelentes ensinos bíblicos referentes à liderança. De fato, “toda a Escritura é inspirada e útil”! Aqui observaremos alguns ensinos bíblicos relacionados ao planejamento e organização na obra de Deus. Ao estudarmos este capítulo, descobriremos princípios que se aplicam a todo trabalho humano. Destacamos cinco fatos que nos chamam a atenção e são dignos de nota.
1. Mobilização: O capítulo 3 registra a lista daqueles que participaram da reconstrução dos muros de Jerusalém. Depois da convocação para o trabalho, registrada no capítulo 2, uma fantástica mobilização tomou conta da cidade. Por causa desta mobilização, alguns chegam a colocar Neemias como o pai do chamado “mutirão”; afinal, nos trinta e dois versículos, temos citados, nominalmente, trinta e oito trabalhadores e quarenta e dois grupos diferentes de trabalho identificados. Além destes, havia muitos outros trabalhadores cujos nomes Neemias não citou, mas que também foram essenciais para a reconstrução. A mobilização para a reconstrução foi grande. Entre as pessoas que se mobilizaram para trabalhar, destacamos duas. A primeira é Eliasibe, o sumo sacerdote. O texto diz que ele e seus irmãos, os sacerdotes, dispuseram-se a reconstruir a Porta das Ovelhas (v. 1). Eles reconstruíram a “Porta das Ovelhas”, que ficava perto do bairro residencial, onde moravam os sacerdotes, no complexo do templo. É interessante notar que somos informados de que eles se “dispuseram”. O trabalho foi voluntário e não imposto. “O envolvimento do sumo sacerdote era significativo, porque depois do exílio sua posição passou a ser considerada de suprema importância”. [1] A posição de destaque do sumo sacerdote não o isentou do trabalho. Ele foi o primeiro a abraçá-lo e tornou-se o exemplo dos demais. Outro exemplo a ser mencionado é o de Baruque. Ele fez o seu trabalho com “grande ardor” (v. 20). Esta expressão, no hebraico, tem o sentido de “incandescer”. Baruque trabalhou com bastante entusiasmo e queimou muitas calorias! Por isso, seu exemplo ficou registrado. Estes são apenas alguns, dos muitos trabalhadores que se mobilizaram para a obra.
2. Discordância: Na obra de Deus, deve haver muito mais trabalhadores do que espectadores. Podemos ver o quanto Jerusalém estava cheia de trabalhadores, a mobilização para realizar a obra de Deus foi grande. Todavia, não houve apenas aqueles que abraçaram o projeto. Uma minoria não estava disposta e Neemias fez questão que isso ficasse registrado. Quem são eles? Leia você mesmo: Os tecoítas reconstruíram o trecho seguinte; mas os seus nobres não se dispuseram a fazer o serviço e a se submeter aos seus supervisores. Tecoa era uma cidade que ficava ao sul de Jerusalém, uns dezenove quilômetros. Os nobres de Tecoa eram preguiçosos e indiferentes, não se interessaram pelo projeto e nem contribuíram com a sua parte. Esses homens se achavam bons demais para ajudar; não moveram uma só palha; não assentaram um único tijolo; não quiseram arriscar as suas vidas na obra do Senhor. A versão Almeida Revista e Corrigida diz que eles “não meteram o seu pescoço ao serviço de seu Senhor”. Todavia, o fato de estes não quererem trabalhar não atrapalhou o andamento da obra. Neemias trabalhou com quem estava disposto. E é assim mesmo que tem de ser. Em qualquer grupo ou igreja, não devemos esperar por unanimidade. Sempre haverá os discordantes, sempre haverá aqueles que se acham muito bons para por a mão no arado. A melhor coisa a fazer é ignorá-los e continuar o trabalho.
3. Organização: Se há um fato que chama à atenção é a organização. Em “toda a extensão dos muros e suas diversas portas, cada um sabia exatamente a parte da obra que lhe competia. Neemias anotava tudo e acompanhava cada parte do trabalho, atentamente”. [2] É incrível como ele preservou uma lista com o nome dos trabalhadores do muro e o que cada um deles fez. Por exemplo, os filhos de Hassenaá construíram a porta do Peixe (v. 3); Hanum e os moradores de Zanoa reconstruíram a porta do Vale (v. 13). A porta da Fonte foi reconstruída por Salum (v. 15). Neemias cita várias pessoas, família por família, e sabe o que cada um fazia e como estava indo a obra! É bom que se diga também que Neemias era organizado, mas não era complicado. Todo esse grande projeto foi planejado de modo simples e com muita sabedoria. Os trabalhadores foram organizados de acordo com os grupos que já existiam. Neemias trabalhou com equipes já formadas: sacerdotes, homens de Jericó, Tecoa, etc. Além disso, ele distribuiu as tarefas corretamente e sabia delegar. Não era centralizador. Colocou pessoas no lugar certo, e fez com que elas trabalhassem em equipe. Pense no que poderia ter acontecido, se, depois de motivar as pessoas para o trabalho (cap. 2), Neemias simplesmente dissesse que elas fizessem o trabalho do jeito delas, sem delegar as tarefas e coordenar o projeto. É possível que, em lugar de um muro, o que se obteria seria um desastre. Por isso, Neemias caminhou ao redor de todo o muro e o dividiu com todo o cuidado, usou aquela cavalgada da meia-noite para dividir mentalmente o muro em seções. [3]
4. Diversidade: Outro fato que chama à atenção nessa lista dos construtores do muro é a diversidade dos trabalhadores: Deus usou todo tipo de pessoa em sua obra! Gente das mais diversas profissões e classes sociais; todos se tornaram construtores do muro, dentre os quais destacamos: Uziel, um dos ourives; Hananias, um dos perfumistas (v.8). Homens habilidosos no fabrico de artigos de ouro e produtos químicos, incluindo perfumes, deixam de lado suas profissões para virarem pedreiros por algum tempo, pegando no pesado, assentando tijolos! E não foram só estes: alguns governadores de distritos de Jerusalém (v. 9, 12, 18); levitas (v. 17); sacerdotes (v. 22); servos (v. 26); comerciantes (v. 32), dentre outros, também estavam trabalhando. Contudo, o mais surpreende nessa diversidade é o versículo 12. Ele diz que um maioral, chamado Salum, trabalhou junto com suas filhas. É interessante observar esse detalhe; afinal, a mão de obra feminina não era valorizada. É incrível como Neemias fez com que todos pudessem trabalhar. Conseguiu até que moças trabalhassem com seus pais, numa época em que o serviço feminino não era sequer mencionado. É tão surpreende essa menção que alguns estudiosos, incapazes de acreditar no que diz o texto, afirmam que estas “filhas” são uma referência às “vilas” dependentes de Jerusalém. Esse argumento não é razoável! Não há nenhum indício neste texto que aponte esse significado. O mais certo mesmo é que “operárias trabalharam naquela parte das muralhas”. [4] Que fantástico! Todos podem trabalhar na obra de Deus!
5. Praticidade: Se você ler atentamente o capítulo 3 de Neemias, verá que a expressão “em frente a sua casa” se repete algumas vezes (vs. 23, 28, 29, 30). Neemias escalou o povo para trabalhar perto de casa, ou seja, não havia pessoas viajando grandes distâncias para realizar a obra, a não ser os que vinham de fora. A empreitada era bastante árdua, mas a proximidade de casa tornava as coisas mais práticas: “não era preciso perder tempo e energia para ir ao trabalho, as pessoas alimentavam-se em casa, davam mais assistência à família e, além disso, esse sistema era muito seguro, no caso de tentativa de sabotagens ou ataques do inimigo”. [5] A vigilância era constante! Essa estratégia “aliviava os trabalhadores de ansiedades desnecessárias e os encorajava a fazer o máximo”. [6] Pense: se os muros serviam para proteger a cidade dos inimigos, e as pessoas estão construindo algo que vai proteger a sua casa e família, vão fazer um bom trabalho! Quando os pais de família não estivessem em casa, saberiam que os muros estariam lá, para proteger a sua família. “As pessoas trabalham com mais dedicação quando tem um interesse pessoal. (…) quando designo pessoas para trabalharem perto de suas casas, (…) as pessoas se sentem donas do projeto”. [7]
APLICANDO A PALAVRA DE DEUS EM NOSA VIDA
Supervisão: Ao ler o capítulo 3 de Neemias, alguém pode perguntar: “Mas, onde está o nome de Neemias nessa lista? Por que ele não tem o nome neste capítulo? O que ele ficou fazendo?” Neemias estava na primeira linha, supervisionando o trabalho. Ele não cruzou os braços e ficou assistindo a tudo passivamente. Ele estava coordenando e mobilizando o povo ao trabalho. Para que haja sucesso em todo o tipo de trabalho em grupo, seja na obra de Deus ou não, é preciso que haja coordenação ou supervisão do trabalho. Alguém precisa estar à frente. Isso não significa que quem está à frente é mais especial para Deus e pode pisar no que é liderado. Por isso, não trabalhe contra o seu líder, mas a favor dele.
Colaboração: Durante o tempo em que o muro estava sendo reconstruído, não faltou oposição. Constantemente, os inimigos do povo de Deus investiam tentando paralisar a obra. Por que eles não conseguiram êxito? Um dos motivos: o povo sempre trabalhou unido, em equipe. A própria organização do trabalho, por parte de Neemias favoreceu isso. Ele organizou o povo por grupos que já existiam. As pessoas já se conheciam, se ajudavam e encorajavam umas as outras. Havia colaboração. É assim que deve ser na obra de Deus. Os ataques virão. A obra de Deus não caminha sem oposição. Por isso, precisamos trabalhar unidos, como o corpo de Cristo. Precisamos uns dos outros. Ninguém vai muito longe sozinho. A igreja primitiva é um exemplo nesse sentido, pois se dedicava à comunhão (At 2:42).
Valorização: Neemias valorizava as pessoas. Ele conhecia os colaboradores da obra de Deus pelo nome. O capítulo 3 do seu livro é a prova disso! “Hoje vivemos num tempo de despersonalização, em que você é conhecido por um número ou pelo cartão de crédito. Mas você não é apenas um número na estatística”. [8] Se quisermos ter sucesso e ver a obra de Deus avançar de modo correto, devemos valorizar corretamente as pessoas, interessar-nos por aqueles que servem a Cristo conosco. Por exemplo, em vez de julgar alguém por ter chegado atrasado a uma reunião ou culto, que tal perguntar se aconteceu alguma coisa, primeiro.
CONCLUSÃO:
Neemias não teria conseguido ir muito longe, se não tivesse conseguido a colaboração do povo de Jerusalém que o ajudou a reconstruir os muros. No capítulo 4, ele próprio reconhece isso, quando diz que estavam conseguindo edificar o muro, porque o povo tinha ânimo para trabalhar (Ne 4:6). Sob seu comando e organização, a obra de Deus foi adiante. Por esta razão, sempre que olharmos para o capítulo 3 do livro de Neemias não nos esqueçamos: planejar é preciso! Esta grande lista de nomes é a prova de que Neemias, homem chamado por Deus, sabia o que estava fazendo. Que os princípios aprendidos neste estudo possam ser aplicados em nosso dia-a-dia. Amém!
Que Deus nos abençoe!

Bibliografia
1. ADEYEMO, T. (Ed.). Comentário bíblico africano. São Paulo: Mundo Cristão, 2010. pág. 549
2. GRETZ, J. R. O prefeito de Jerusalém: Segredos de Neemias para os líderes de hoje. Florianópolis: GB Comunicação, 1997. pág. 49
3. WARREN, Rick. Liderança com propósitos. São Paulo: Vida, 2008. pág. 86
4. CHAMPLIN, Russell Norman. O Antigo Testamento Interpretado: versículo por versículo. Vol. 3. São Paulo: Candeia, 2000. pág. 1782
5. GRETZ, J. R. O prefeito de Jerusalém: Segredos de Neemias para os líderes de hoje. Florianópolis: GB Comunicação, 1997. pág. 50
6. LOPES, Hernandes Dias. Neemias: O líder que restaurou uma nação. São Paulo: Hagnos, 2006. pág. 58
7. WARREN, Rick. Liderança com propósitos. São Paulo: Vida, 2008. pág. 88
8. LOPES, Hernandes Dias. Neemias: O líder que restaurou uma nação. São Paulo: Hagnos, 2006. pág. 61

DEC - PCamaral

Nenhum comentário:

Todos os comentários serão moderados. Comentários com conteúdo fora do assunto ou do contexto, não serão publicados, assim como comentários ofensivos ao autor.

Tecnologia do Blogger.