Os riscos da intimidade





Por Maurício Zágari em Apenas

Um conselho: não queira me conhecer pessoalmente. Um grande amigo costuma dizer que “de longe todas as montanhas são azuis, mas de perto são pedra e lama”. Pura verdade. Não foram poucas as pessoas que tomaram conhecimento da minha existência pelas coisas que escrevo, quiseram se aproximar e, depois de um tempo de convivência, sumiram. E não as censuro: elas simplesmente conheceram quem eu sou de verdade, com meus defeitos, meus pecados, minhas incorrigíveis falhas. E aí perdi a graça, pois deixei de ser aquele ser idealizado que elas achavam que eu era pelas coisas que escrevo e passei a ser… eu mesmo. Cá entre nós: sorte dessas pessoas, porque não há nada pior do que se relacionar com alguém que não é quem se pensa. Por isso admiro aqueles que descobrem quem é o verdadeiro "eu" e ainda assim continuam querendo conviver comigo. Acredito que Deus também admira os que o conhecem intimamente e, ainda assim, decidem permanecer convivendo com ele.

Claro que não dá para me comparar com Deus. No meu caso, as características que as pessoas que se aproximam de mim descobrem são todas negativas – minhas fraquezas morais, rabugice, impaciência, antipatia, preguiça, intolerância, palavras mal postas e por aí vai. Só coisas ruins, que agarram-se à ideia idealizada de quem eu sou como ferrugem a uma escultura. Já no caso de Deus é diferente. Paradoxalmente, o que faz muitas pessoas se afastarem dele quando o conhecem mais intimamente é sua real natureza, que, obviamente, é extremamente positiva – mas pode desanimar muitos.

Pense comigo e veja se não é assim: a pessoa se converte. Em nossos dias, a pregação fácil que impera nos púlpitos cria um Deus idealizado, digno de ser amado por todos: que te fará prosperar em tudo, que vai curar todas as tuas doenças, que te fará ter uma vida eletrizantemente maravilhosa, que te dará tudo aquilo que você lhe pedir se tiver fé… que Deus extraordinário! A imagem que propagamos do Senhor é um ser disposto a dar, dar, dar, dar, dar, dar, dar e dar, num frenesi abençoador sem limites. Eu olho para um Deus desse, que sacia-me o tempo todo, e a paixão é imediata. Quem não se apaixonaria? Eu decreto que quero de volta o que é meu e me asseguram que ele vai dar. Gente, por onde andava esse Deus que eu ainda não tinha encontrado?! E, se você se mantém na superficialidade do conhecimento sobre ele, é esse Deus mesmo que terá: uma caricatura distante e idealizada do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Gente boa, mas irreal.

Só que algumas pessoas cometem o pecado imperdoável: decidem se aproximar de Deus e conhecê-lo mais intimamente. Começam então a estudar a Bíblia. Passam a ler bons livros cristãos. Ingressam em grupos de debate bíblicos onde se aprofundam nas questões sobre o Senhor. Matriculam-se em seminários teológicos. Passam a ser discipuladas por cristãos de verdade. E aí, meu irmão, minha irmã, ocorre o choque: descobrem que aquele Deus que, de longe, era tudo o que pediram a Deus, na verdade não é bem do jeito que tinham idealizado.

Descobrem que ele é amor e graça, mas que seu juízo é severo. Reparam que muitos e muitos cristãos vão nascer, viver e morrer materialmente pobres. Percebem que, por mais incomensurável que seja a fé delas, se a soberania e a vontade divinas não quiserem lhes dar algo, simplesmente não receberão. Notam que os anos se passarão e, por mais que muitos irmãos ao seu redor tenham muita fé, não serão curados de suas doenças. Se espantam por ver que os sofrimentos vêm muitas e muitas vezes ao longo de sua caminhada com Cristo. Se dão conta de que estão deprimidos, mesmo tendo o Senhor em sua vida. Percebem que Deus diz “não” muitas vezes a nossas vontades. E por aí vai.

Muitos não suportam a intimidade com Deus. A realidade divina interessa pouco a quem o idealizou como um Deus que não faz outra coisa da vida a não ser abençoar. Não pouca gente se decepciona com a real caminhada com Jesus, que é bem diferente daquele triunfalismo mar de rosas que lhe ensinaram no início da sua vida de fé. E, por isso, acaba se afastando dele. Pois creu num Deus idealizado e, quando se aproximou de fato, notou que não era como a caricatura que pintaram dele. E de fato não é, perseverar na fé exige de nós amar Jesus com todas as coisas nele que não nos agradam (como, por exemplo, abrir mão de nós mesmo, tomar a nossa cruz e, só então, segui-lo).

Não culpo quem se aproximou de mim, descobriu quem eu sou de fato e depois se afastou, sumiu, perdeu o interesse. Seu erro não foi se aproximar, mas acreditar na imagem idealizada e irreal que tiveram no começo – e que está longe de ser quem de fato sou. Se viessem dispostos a amar, encontrem quem encontrarem, não teriam se decepcionado. Do mesmo modo, é uma pena que haja quem se aproxime de Deus crendo que ele é aquele bom velhinho de amor sem justiça, graça sem obras, paz sem renúncia e bem-bom sem sofrimentos. Deus é Deus e felizes os que descobrem quem ele verdadeiramente é desde o início. Que chegam até ele dispostos a amá-lo encontrem quem encontrarem. Pois aí passarão a amar o Jesus de verdade, mesmo que Ele seja diferente do que inicialmente imaginaram.

Apesar de eu ser esse poço de problemas e pecados, ainda assim há quem persista em ser meu amigo ao descobrir o vaso de barro todo rachado que eu sou – vai entender. Esses não estão ganhando muito com isso. Vantagens maiores têm aqueles que, mesmo sabendo que estar com Jesus vai exigir muito de si, ainda assim persistem em se relacionar com ele. E esses estão ganhando tudo com isso: a vida eterna.

Paz a todos vocês que estão em Cristo,



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