A Triunidade de Deus
Você acredita na triunidade de Deus? Você pode responder: Não! Não acredito! Ou sim, eu acredito, ou, talvez: Acredito mas não consigo entendê-la nem explicá-la. Resumindo, muitos crentes das igrejas dizem acreditar na triunidade de Deus mas admitem que não entendem como ela se constitui. Para esclarecer parte das dúvidas que rondam o assunto, e poder se fazer entender esta valiosa doutrina, dividi o estudo em duas partes. Na primeira parte vamos separar as principais passagens bíblicas que expressam a comprovam a triunidade de Deus. Na segunda parte veremos que a triunidade de Deus não é uma doutrina abstrata, pelo contrário, é uma doutrina prática, pois nos ensina o valor da colaboração humilde, o valor do relacionamento afetuoso e do conhecimento pessoal.
Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; (Mateus 28:19)
I - O que a Bíblia nos fala sobre a triunidade de Deus?
A palavra “Triunidade” ou “Trindade” não aparece nas Escrituras Sagradas. Trata-se de um termo criado pela teologia para expressar uma doutrina ensinada pela Palavra de Deus. Que doutrina? A de que “Deus existe eternamente como três pessoas – Pai, Filho e Espírito Santo – e cada pessoa é plenamente Deus, e existe um só Deus” [GRUDEM, W. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 2006, pp. 165-197]. Esta doutrina não é fruto da imaginação humana, mas, sim, da revelação bíblica. Esta revelação não acontece de uma só vez. Ao contrário, ela vai sendo apresentada e demonstrada pouco a pouco. Isso se chama revelação progressiva.Pense no povo de Israel, eles seriam capazes de escutar e entender esta doutrina tão complexa e misteriosa imediatamente? Claro que não! A mente deles ainda era bastante imatura. Como diria o apóstolo Paulo, ainda falavam como meninos, entendiam como meninos, pensavam como meninos (I Co 13:11). Além do mais, eram rodeados de nações que adoravam muitos deuses em seus cultos. Se não fosse bem entendida, a doutrina da Trindade poderia conduzi-los à prática da idolatria. O fato é que, por causa dessa meninice e desse politeísmo, o sábio Deus foi cuidadoso e cauteloso em declará-la. Ele não queria que essa verdade fosse corrompida por aqueles que deveriam preservá-la.
A doutrina da Trindade é indicada no Antigo testamento?
Sim. Observe este versículo: Disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança (Gn 1:26). Por que Deus utiliza o verbo “fazer” no plural, quando se refere a si mesmo? Têm sido dadas muitas explicações. Claro que não abordaremos todas, o que podemos dizer, de modo breve, é que, ao usar o plural, Deus não está, como querem alguns, apenas usando o plural majestático, que é o emprego da primeira pessoa do plural no lugar da primeira pessoa do singular. O plural majestático não era conhecido nem empregado pelos hebreus, quando Gênesis foi escrito. Não significa também que Deus esteja falando com anjos, pois se sabe, pela própria Bíblia, que, em nossa criação, eles não tiveram envolvimento algum. Nem tão pouco significa que o plural foi usado somente porque a palavra original empregada para Deus no idioma original é Elohim, que é uma palavra no plural. O melhor mesmo é aceitarmos que o plural desta frase é uma prova de que, no inicio de tudo, o eterno Deus já existia em três pessoas: Pai, Filho e Espírito Santo. No Novo testamento (Jo 1:1), está claro que o Filho estava envolvido na criação de todas as coisas. Gênesis 1:2 indica, ainda, que o Espírito Santo também estava envolvido no processo de criação.Outros textos do próprio Antigo Testamento que sugerem que em Deus existem três pessoas diferentes, que também conversam entre si são: Gn 3:22, 11:7; Is 6:8; Sl 110:1. Desses textos, vamos pensar um pouco apensa no Salmo 110:1: Disse o SENHOR ao meu senhor: Assenta-te à minha direita, até que eu ponha os teus inimigos debaixo dos teus pés. Aqui, duas pessoas distintas conversam. Quem? Alguém pode afirmar: Deus e Davi! Mas se formos analisar mais a fundo, de acordo com o ensino de Jesus e de Pedro, o diálogo acontece entre o Deus Pai e o Deus Filho (Mt 22:44; At 2:34).
Mas é no Novo Testamento que encontramos a revelação mais completa da doutrina da Trindade. O povo de Deus da Nova Aliança é mais maduro. Depois de tanto tempo, tem condições de digerir alimento sólido (Hb 5:12,14). Por esta razão, recebe revelações mais explicitas a respeito dessa doutrina. Há revelação mais clara do que a que foi dada por ocasião do batismo de Jesus? (Mt 3:16-17)
Batizado Jesus, saiu logo da água, e eis que se lhe abriram os céus, e viu o Espírito de Deus descendo como pomba, vindo sobre ele. 17 E eis uma voz dos céus, que dizia: Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo.
Veja que este texto mostra as três pessoas da Trindade – o Pai, o Filho e o Espírito Santo – agindo distintamente. Outros textos em que encontramos a trindade divina revelada são: Mt 28:19; Jo 14:26; ICo 12:4-6; II Co 13:13; Ef 4:4-6; I PE 1:2; Jd 20:21.
Em que aspecto estas pessoas da Trindade são distintas? Devemos deixar claro que essa distinção entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo não é de atributos divinos. Não podemos dizer que uma das pessoas da Trindade seja mais onisciente, ou mais onipotente que a outra. Por que não? Porque cada pessoa é plenamente Deus: O Pai é reconhecido como Deus (Rm 1:7), o Filho é reconhecido como Deus (Jo 1:1-4) e o Espírito Santo é reconhecido como Deus (At 5:3-4). Os três membros são iguais em poder e glória. Não há um que seja superior ao outro.
A diferença não é de natureza, portanto, mas, sim, de relações: “A única diferença entre eles é o modo como se relacionam uns com os outro e com a criação” [GRUDEM, W. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 1999, p 165.]. Essas distinções existiram eternamente, e não apenas no tempo em que fomos criados (Jo 1:3; ICo 8:6; Hb 1:2) ou salvos (Ef 3:14-15; Jo 1-5,14,18,17:4; Fp 2:5-11). As pessoas da Trindade sempre existiram e viveram dessa maneira.
O exposto anteriormente não nos compele a afirmar a existência de três deuses divididos e distintos. Não devemos confundir três pessoas com três Deuses. Isto seria triteísmo. As Escrituras Sagradas declaram, explicitamente, tanto no Novo quanto no Antigo Testamento que há apenas um único Deus: Ouve, Israel, o SENHOR, nosso Deus, é o único SENHOR (Dt 6:4; Mc 12:28). Nos dois Testamentos, o ensino é: Deus é um só ser (Ex 15:11; I Rs 8:60; Is 45:5-6, 44:6-8; I Tm 2:5; Rm 3:30; Tg 2:9). Ainda que muitos digam que há vários deuses, para nós, há um só Deus, pois a fé universal é esta:
Que adoremos um único Deus em Trindade, e a Trindade em unidade. Não confundindo as pessoas, nem dividindo a substância. Porque a pessoa do Pai é uma, a do Filho é outra, e a do Espírito Santo outra. Mas no Pai, no Filho e no Espírito Santo há uma mesma divindade, igual em glória e coeterna majestade. O que o Pai é, o mesmo é o Filho, e o Espírito Santo. O Pai é não criado, o Filho é não criado, o Espírito Santo é não criado. O Pai é ilimitado, o Filho é ilimitado, o Espírito Santo é ilimitado. O Pai é eterno, o Filho é eterno, o Espírito Santo é eterno. Contudo, não há três eternos, mas um eterno. Portanto não há três (seres) não criados, nem três ilimitados, mas um não criado e um ilimitado. Do mesmo modo, o Pai é onipotente, o Filho é onipotente, o Espírito santo é onipotente. Contudo, não há três onipotentes, mas um só onipotente. Assim, o Pai é Deus, o Filho é Deus, o Espírito Santo é Deus. Contudo não há três Deuses, mas um só Deus. Portanto o Pai é Senhor, o Filho é Senhor, e o Espírito Santo é Senhor. Contudo, não há três Senhores, mas um só Senhor. [Credo de Atanásio, extraído de Grudem (1999:997)].
II - Aplicando o conhecimento em nossa vida:
A triunidade de Deus nos ensina o valor da colaboração humilde:
Embora as pessoas da Trindade sejam pessoalmente distintas, nenhuma delas age de forma independente e individualista. Não exercem ou seus papeis ou funções com espírito de competição, de supremacia, de rivalidade. Elas, em momento algum, demonstram a necessidade de fazer algo para afirmar sua identidade ou buscar sua realização. O tempo todo, vemos uma glorificando a outra (Jo 8:54, 12:27, 17:1; 16:14). Elas colaboram humildemente umas com as outras. Pense, por exemplo, no projeto de salvação de humanidade: Cada pessoa da Trindade colaborou, de maneira submissa e obediente (Jo 3:16; Gl 4:4; Ef 1:9-10; Hb 10:7; Jo 14:26; Rm 8:13; At 1:8; I Co 1:12-17). Portanto, a melhor forma de colaboração interpessoal encontra-se claramente mostrada na triunidade de Deus.Em algumas igrejas, há mais competição que colaboração. Os seus membros e líderes sofrem daquilo que o escritor e teólogo John Stott chamou de “holofotite”: o colocar-se sob os holofotes. Por essa razão, nesses locais, nada vai para frente porque não há visão de grupo, de corpo, de equipe, de reino, de igreja. Devemos evitar nos portar desse modo. O Senhor da igreja não aceita ser usurpado. Não podemos nos colocar no lugar dele. A igreja é Dele, e não nossa. Nós somos servos. Devemos nos relacionar com os demais como servos. Submeta-se ao Senhor e trabalhe junto, ombro a ombro com os irmãos. Não queira dominar e aparecer. Reconheça e valorize o serviço alheio e não se ponha acima dos demais (I Co 3:7). Quem é espiritual sabe se subordinar! Nossa maior busca deve ser a de sermos sempre servos, e nunca senhores (Lc 22:27).
A triunidade de Deus nos ensina o valor do relacionamento afetuoso:
O Deus da Bíblia existe eternamente como três pessoas distintas: Pai, Filho e Espírito Santo. No principio, portanto, ele não estava só e não nos criou porque carecesse de companhia (Gn 1:26). Ele não era triste e isolado. Ele convivia em harmonia amorosa e em felicidade plena. Jesus fala ao Pai, da glória que este, lhe havia conferido, porque o amara antes da fundação do mundo (Jo 17:24). Este amor, porém, não é teórico, mas, é prático.. Eles amam a si mesmos, mas também amam aos outros. Deus amou e ama o mundo (I Jo 4:10; Rm 5:8, 3:13, 2:20). Enfim, a Trindade é relacional.Precisamos compreender, a partir da Trindade, que a natureza primeira de Deus é relacional, “e que Ele nos criou conforme a sua imagem e semelhança para vivermos, como a Trindade, em verdadeira relação de amizade e amor” [SOUZA, R.B. O Caminho do Coração: Ensaios sobre a Trindade e a Espiritualidade Cristã. Curitiba: Editora Encontrão, 1996, p.96]. Não fomos criados, nem salvos, para vivermos isoladamente. A imagem do Deus triúno é refletida, não no isolamento humano, mas, sim, na convivência. Temos, porém, intimizado a vida cristã, mas ela é relacional. Scheffer, pensador cristão do século passado, talvez o mais brilhante, disse que a salvação é individual, mas não individualista. Seguir a Cristo é viver em grupo. Não é verdade que se pode ser crente fora da Igreja, e, de uma igreja. A maior ênfase do Novo Testamento é nos relacionamentos. Assim, uma igreja sadia, em que o Espírito Santo age, manifesta ambiente de camaradagem, amor e respeito mútuos. Os irmãos se amam, se estimam sinceramente.
A triunidade de Deus nos ensina o valor do conhecimento pessoal:
As pessoas da Trindade não somente vivem juntas, elas se conhecem intimamente ou pessoalmente. Sobre isso, Jesus afirma que: Ninguém conhece o Filho, senão o Pai; e ninguém conhece o Pai, senão o Filho (Mt 11:27). Ele diz também: o Pai me conhece a mim, e eu conheço o Pai (Jo 10:15). Em sua primeira epístola aos Coríntios, Paulo, por sua vez declara: ... quanto a Deus, somente seu próprio Espírito conhece tudo a respeito dele (I Co 2:11b – NTLH). A igreja é, muitas vezes, o lugar dos desconhecidos. Por nos sentarmos de costas uns para os outros, conhecemos mais a “nuca” do que o “rosto” do irmão. Cantamos os mesmos hinos e escutamos os mesmos sermões, mas não nos conhecemos pessoalmente. Por não nos conhecermos, não nos importamos, não nos entendemos, não nos valorizamos e nem nos respeitamos.Conhecer alguém é saber o que essa pessoa pensa sobre as coisas, saber quais são os seus valores; é saber como são suas reações diante das situações, desde as mais banais até as mais sérias; é saber quais são suas qualidades, seus talentos, seus pontos fracos, seus defeitos, suas dificuldades e suas manias; é saber até onde a outra pessoa pode ir, até onde ela pode ser tolerante, generosa, disponível ou trabalhadora e onde estão os seus limites: o que se pode esperar e o que não se pode esperar dela.
Prossigamos em conhecer ao Senhor, mas também prossigamos em conhecer aquele que se senta conosco, todos os cultos, para adorar a Deus. Cresçamos na graça e no conhecimento do Senhor, mas também cresçamos em conhecer aquele que está ao nosso lado, na Igreja.
Conclusão:
O alicerce da doutrina da Trindade não são os sentimentos, as experiências e as especulações humanas. Esta sublime doutrina se fundamenta no numeroso, eloqüente, inerrante, e confiável testemunho das Escrituras Sagradas. Podemos concluir, então, dizendo o seguinte: [1] Há somente um Deus (monoteísmo). Não há, na Trindade, três Deuses separados, autônomos, individuais. Deus é indivisível em sua natureza. [2] Há três pessoas – o Pai, o Filho e o Espírito Santo. São três pesoas reais e diferentes, e não uma única pessoa que se revela às pessoas de “modos” diversos em “épocas” diferentes. Enfim [3] há igualdade entre as Pessoas. A natureza divina do Filho e do Espírito Santo não são apensa semelhantes à do Pai; ambos tem a mesma natureza divina do Pai, ou seja, são iguais ao Pai no seu ser e em todos os seus atributos. Não é correto nem bíblico dizer, por exemplo, que o Filho e o Espírito Santo sejam menos bondosos ou menos amorosos que o Pai.O Filho não foi, em dado momento, criado por Deus Pai, como um ser superior e perfeito; e o Espírito Santo é Deus e não uma força, um poder impessoal derivado do Pai, como alguns defendem. Os dois não são inferiores ou menores que o Deus Pai. Os três são iguais! Os três são UM!
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