Não seja um cristão indiferente!
Vivemos em um mundo, como disse Jesus, repleto de aflições (Jo 16:33). Costumeiramente ouvimos notícias de tsunamis e terremotos em países, assassinatos e abuso de crianças, injustiça social, etc. Estamos tão familiarizados com esta realidade que, por vezes, ela não nos comove. Às vezes somos indiferentes aos que estão mais próximos a nós, como os da família e os da igreja. Neste estudo, vamos analisar o exemplo de Neemias, e qual deve ser nossa atitude em relação às necessidades dos que nos cercam.
I. O texto em foco
Precisamos relembrar a história, até chegarmos a Neemias. Israel alcançou expressão como nação por meio dos reis Saul, Davi e Salomão. No final de sua vida, Salomão comprometeu-se com o mundo e quebrou a aliança feita com Deus. Sendo assim, Deus sentenciou o reino à divisão (cf. 1 Re 11:11-12). Resumidamente, o povo decaiu nos princípios morais, afastando-se de Deus, e recebeu o castigo: os assírios invadiram Israel e o Reino do Norte foi massacrado em 722 a.C.; e em 586 a.C. Nabucodonosor, rei da Babilônia, invadiu Jerusalém e o povo de Judá foi levado cativo (cf. 2 Cr 36:18-20) [1]. Tempos depois, em 539 a.C. a Pérsia vence a Babilônia e decreta a volta dos judeus para sua terra. Cerca de 50 mil hebreus fizeram a viagem de volta para reconstruir o templo (Ed 1:1-11; 2:64-66). Em 458 a.C., durante o reinado do rei persa Artaxerxes, Esdras também vai para Jerusalém, a fim de fazer uma reforma religiosa. Aproximadamente quinze anos se passam, e chegamos à data da nossa história, isto é, aos acontecimentos narrados no capítulo 1 de Neemias.1. Neemias, uma pessoa que se envolve afetivamente
O nome Neemias significa “Javé conforta”, e trazer conforto do Senhor ao seu povo foi sua missão. É provável que ele tenha nascido já no cativeiro, em uma cultura de forte influência pagã; entretanto, cresceu comprometido com o Deus de seus antepassados. Era copeiro do rei Artaxerxes, em Susã, onde se localizava a residência de inverno do monarca. Esta era uma função de confiança, pois, para evitar o envenenamento do rei, o copeiro provava o vinho e supervisionava toda alimentação do palácio. Sendo assim, era uma pessoa de muita influência, em razão do constante acesso à presença do rei.Tendo eu ouvido estas palavras, assentei-me, e chorei, e lamentei por alguns dias; e estive jejuando e orando perante o Deus dos céus. (Ne 1:4)
Entre 446-444 a.C., no mês de quisleu do calendário judaico (equivalente a meados de novembro e dezembro), Hanani, que era irmão de Neemias, regressou de uma viagem a Judá. O texto narrado por Neemias diz: ... então, perguntei pelos judeus que escaparam e que não foram levados para o exílio e acerca de Jerusalém (1:2 ). Neemias é alguém que faz perguntas, veja seus dois questionamentos: acerca dos judeus e de Jerusalém. Por que ele, que tinha uma vida bem sucedida e segura, se preocuparia com pessoas que viviam a mais de 1400 km de distância? Talvez ele pudesse pensar, justamente, que os pecados era o que havia trazido o julgamento do Senhor sobre a cidade de Jerusalém e sobre o povo de Judá, e isso definitivamente não era culpa sua. Entretanto, este pensamento não sobressaía, pois era um homem compadecido. Veja o que a sequência do texto diz: Tendo eu ouvido estas palavras (Ne 1:4a).
Neemias não era alguém que perguntava simplesmente por perguntar, mas tinha tempo para ouvir. E ouvir implica prestar atenção ao que é falado. Neemias não tinha apenas curiosidade, mas preocupação verdadeira. O relato de Hanani foi o seguinte: ... estão em grande miséria e desprezo; os muros de Jerusalém estão derribados, e suas portas, queimadas (Ne 1:3). Neemias ouviu e compreendeu a grande aflição do remanescente e percebeu a insegurança e vulnerabilidade em que viviam devido à falta de proteção e ao abandono. A resposta do copeiro foi a mais sensível possível: ... assentei-me, e chorei, e lamentei por alguns dias (Ne 1:4b). Observe as três reações de Neemias: assentar, chorar, lamentar. Ele pranteou da mesma forma que os judeus costumavam fazer. Ele era um deles. Neemias se identificou com o sofrimento do seu povo; foi empático. Lamentou como se aquela situação deplorável estivesse acontecendo consigo mesmo. Ele chorou porque a cidade de seus pais estava em ruínas, o Templo onde Deus era adorado estava desprotegido, e chorou, principalmente, porque Deus estava sendo escarnecido. A preocupação de Neemias era com a glória de Deus e com o bem-estar do povo [2]. Mesmo tendo uma alta posição e estando longe do problema, Neemias não era um sujeito absorto em um mundo de riquezas e alienação, mas era alguém compadecido e disposto a ajudar.
2. Neemias, uma pessoa que se envolve espiritualmente:
Neemias não apenas lamentou. Observe o que diz o texto: ... estive jejuando e orando perante o Deus dos céus (Ne 1:4c). É interessante que ele foi impelido afetivamente a ajudar, mas não agiu precipitadamente. Ele poderia ter ido imediatamente até o rei Artaxerxes, a fim de encontrar apoio; contudo, sabia que o auxílio que viria do Deus dos céus seria fundamental, nessa ocasião. Por esse motivo, levou o problema ao Rei dos reis. Foi incansável diante do Senhor: orou por cerca de 120 dias (cf. 1:1; 2:1) [3].A primeira ação de Neemias foi jejuar.
O jejum é uma prática frequente na Bíblia (1 Sm 7:6; Ed 8:21; Et 4:16; Sl 109:24; Jn 3:5; Mt 6:17; At 14:23), que consiste em abster-se de alimentos em busca do propósito de andar com Deus. Veja que não se resume simplesmente em deixar de alimentar-se, mas fazer isso com um intuito espiritual. Ele teria muitos obstáculos pela frente, como “a permissão do rei, a mobilização do povo, o ataque dos inimigos, a dureza da obra, a pobreza e o desânimo do povo. Por isso ele jejuou” [4]. Ele precisava buscar fortalecimento no Senhor para essa causa.A segunda ação de Neemias foi orar.
Ao ler todo o livro, vemos que ele era um homem de oração. Podemos conferir doze orações (1:4; 2:4, 4:4,9, 5:19, 6:9,14, 9:5, 13:14,22,29,31). Buscar a Deus era um hábito em sua vida. A oração registrada em Ne 1:5-11 é completa, pois contém todos os elementos: adoração, confissão e petição. Ele começa assim: Senhor, Deus dos céus, Deus grande e temível (1:5a). Essa é a forma correta de se começar uma oração, com adoração, ou seja, com reconhecimento dos atributos e feitos de Deus. Ele enfocou primeiramente a grandeza de Deus e não a gravidade do problema.Em seguida, a maior parte de sua oração foi dedicada à confissão de pecados (Ne 1:6-9).
O Senhor fizera uma aliança com o povo, prometendo bênçãos decorrentes de obediência (Lv 26; Dt 27-30), ou disciplina, caso desobedecessem. Mas Deus prometera que os perdoaria, quando se arrependessem (Dt 30; 1 Rs 8:31-53). Ao confessar os pecados, Neemias se identificou com os pecados daquela geração que sequer conhecera. Observe como ele se inclui na confissão: ... faço confissão pelos pecados (...), os quais (nós) temos cometido (...); pois eu e a casa de meu pai temos pecado (1:6b).Não acusou seu povo, mas colocou-se em posição de igualdade diante de Deus.
Ele reconheceu que a causa do problema era o pecado e fez a confissão específica, em sinal de quebrantamento. Só então fez sua petição: ... concede que seja bem sucedido hoje o teu servo e dá-lhe mercê perante este homem (1:11). Pediu ajuda do Senhor para agir assertivamente e para receber o favor do rei; sabia que oração e trabalho caminham juntos; sendo assim, pôs-se à disposição. Neemias orou antes de fazer seu projeto e Deus mostrou como proceder. “A oração de Neemias é repleta de citações e alusões à aliança de Deus” [5].Mesmo estando distante de seu povo e longe da terra dos seus antepassados, ele não estava longe do Deus que serviam. Ele não se esqueceu de sua tradição, de sua história e nem da palavra de Deus, mas estava envolvido afetiva e espiritualmente com os seus. Ele se envolveu o suficiente para abrir mão do seu conforto e comodismo no palácio e viajar uma longa distância, a fim iniciar um projeto dispendioso para ajudar seus irmãos que estavam numa situação de grande sofrimento.
II. A vida em foco
1. Para vencer a indiferença, faça da empatia um estilo de vida.
Vivemos numa sociedade egoísta e alienada em que a indiferença prevalece. Não se contamine com a indiferença, pois ela caracteriza a ausência de amor. E um dos mandamentos de Jesus foi: Assim como eu os amei, amem também uns aos outros (Jo 13:34). Tenha interesse nas pessoas ao seu redor, pergunte como estão, dedique tempo para ouvir com atenção e, se possível, mobilize-se em favor delas. Neemias chorou. Você tem chorado junto com seus irmãos, tem se compadecido com a violência, a injustiça e a pobreza? Afaste o verniz do coração. Rejeite a polidez que impede a sensibilidade ao sofrimento humano (Rm 12:15).2. Para vencer a indiferença, faça da intercessão um hábito diário.
Neemias intercedeu incessantemente, durante 120 dias, com uma alta frequência diária: dia e noite (1:6). Sua oração não era egocêntrica e interesseira, mas altruísta e amorosa. Sua oração também era recheada de textos bíblicos. Neemias conhecia a palavra de Deus e, consequentemente, conhecia o Deus da palavra. Por esse motivo, sua oração era mais eficaz, pois se baseava no caráter e nas promessas de Deus. Imite Neemias: ore intensamente pelos outros, com sabedoria. Lembre que a oração traz inúmeros benefícios como: paciência, paz de espírito, fé e direcionamento.
3. Para vencer a indiferença, faça da disposição uma virtude constante.
Além da empatia e da intercessão, se quisermos realmente vencer a indiferença e fazer algo para mudar a situação daqueles que sofrem, precisamos nos dispor a fazer o que precisa ser feito. Neemias se ofereceu para fazer o trabalho. Diante das injustiças do nosso tempo, o que nós temos feito? Quando recebemos a notícia de que um irmão nosso está enfrentando dificuldades, qual tem sido nossa postura? Há disposição em ajudar? Se um irmão ou uma irmã estiverem carecidos de roupa e necessitados do alimento cotidiano, e qualquer dentre vós lhes disser: Ide em paz, aquecei-vos e fartai-vos, sem, contudo, lhes dar o necessário para o corpo, qual é o proveito disso? (Tg 2:15-16). Façamos a diferença!Concluindo
Neemias foi um consolador, pois viveu perto das pessoas e foi um intercessor porque viveu perto de Deus [6]. Quando ouviu o relato da miséria e do desprezo em que viviam seus irmãos e da vulnerabilidade de Jerusalém, ele se compadeceu, e mais do que isso: ouviu um chamado. Ele compreendeu que Deus poderia fazer algo por seu intermédio e colocou-se à disposição para ajudar. Mas não sem antes colocar-se de joelhos aos pés do Senhor e jejuar. Querido estudante, não seja indiferente às necessidades do seu próximo, mas veja no sofrimento humano um chamado divino para uma missão.Bibliografia
1. SWINDOLL, Charles R. Vamos construir juntos! São Paulo: Candeia, 2008. pág. 14
2. LOPES, Hernandes Dias. Neemias: O líder que restaurou uma nação. São Paulo: Hagnos, 2006. pág. 27
4. LOPES, Hernandes Dias. Neemias: O líder que restaurou uma nação. São Paulo: Hagnos, 2006. pág.28
5. WIERSBE, Warren W. Comentário Bíblico Expositivo: Antigo Testamento. Vol. 2. Santo André: Geográfica: 2008. pág. 618
6. LOPES, Hernandes Dias. Neemias: O líder que restaurou uma nação. São Paulo: Hagnos, 2006. pág.31
Fonte:
DEC
Paulo Cesar Amaral
Nenhum comentário:
Todos os comentários serão moderados. Comentários com conteúdo fora do assunto ou do contexto, não serão publicados, assim como comentários ofensivos ao autor.